sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

Niterói, 17/12/1961, Há 60 Anos Um Triste Dia: O Incêndio do Gran Circo Norte Americano

Os anúncios do circo nos jornais da época
A lona armada para a exibição
Nunca fui apreciador de circos ou espetáculos circenses. Não por preconceito, nem, muito menos, por desprezo desta arte milenar. Creio que a tragédia do circo em Niterói, que marcou a história da cidade onde nasci, ficou guardada em minha memória. No dia 17 de dezembro de 1961, minha mãe estava grávida de mais de oito meses. Eu nasceria dali quase um mês, em janeiro de 1962. Naquele dia – um domingo de muito calor, abafado e quase sem ventos – meus pais almoçaram na casa do meu tio-avô paterno, Valdomiro Antônio Peralta, tio Valdo, no bairro de Santa Rosa, numa casa que guardo com clareza nas minhas lembranças, pintada de cor meio ocre, situada num lugar alto, sobre uma ladeira. A casa tinha, nos fundos, uma espécie de casa na árvore.

Neste tempo, meu pai era secretário de imprensa do governador Celso Peçanha e ganhara ingressos para o Gran Circo Norte Americano, que estreou dois dias antes e havia sido muito alardeado e objeto de noticias diárias, na antiga capital fluminense. Pela cidade, as pessoas se agitavam, comentavam e procuravam ingressos para "o maior espetáculo da terra", que prometia ser o maior palco circense da América Latina. Depois do almoço, meu pai, que gostava muito destes espetáculos, insistiu com minha mãe para que fossem ao circo. Esta, já próxima do fim da gravidez, alegou muito cansaço e indisposição para ficar debaixo de uma lona abafada, num dia escaldante, que prenunciava o início do tórrido verão fluminense. A esposa de tio Valdo, tia Namir Peralta – a médica obstetra que me trouxe ao mundo, alguns dias depois –, proibiu que minha mãe fosse ao circo naquelas condições, pois, seria muito perigoso tão perto do fim da gravidez. Contrariado, meu pai resignou-se em não ir ao circo, lamentando perder a tão esperada exibição.

No fim daquela tarde, meus pais ouviram as sirenes dos bombeiros e das ambulâncias e os gritos de horror e desespero, que ecoaram pela cidade, anunciando a tragédia que abalaria Niterói e o país inteiro: o mais devastador incêndio em um circo, em toda história circense no mundo. Mais de quinhentas pessoas, queimadas ou pisoteadas, morreram, e mais de duas mil pessoas ficaram marcadas para sempre, no corpo e no espírito, pelas sequelas da catástrofe, que foi criminosa, como depois se apurou. Passados muitos anos da tragédia, ainda era possível reconhecer nas ruas os sobreviventes. Não haveria outro circo na cidade, por décadas.

Durante anos, ouvi esta e outras histórias sobre o terrível incêndio que traumatizou uma geração e deve ter sido responsável pela minha involuntária pouca atração pelos espetáculos circenses. A indisposição de minha mãe, devida a gravidez e a proibição da minha tia-avó médica, nos salvaram deste tristíssimo episódio da história de Niterói, há exatamente 60 anos passados. Dedico este post à memória dos conterrâneos que não tiveram a mesma sorte.       

Republicado para relembrar os 60 anos da tragédia.

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

O Grito das Águias - Novembro de 1958




A reportagem, assinada por meu pai, na Revista da Semana, sobre a prisão disciplinar dos oficiais da FAB, em Minas Gerais, em novembro de 1958. (clique nas fotos para ampliar)

Em novembro de 1958, o então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Francisco de Assis Correia de Mello, embarcou para os EUA numa viagem oficial de três meses. Em seu lugar, o presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira nomeou o general Henrique Teixeira Lott, ministro da Guerra (Exército), para acumular a pasta da Aeronáutica interinamente. O general Lott era hostilizado pelos oficiais da Aeronáutica em decorrência de sucessivas crises e desentendimentos originados nos conhecidos acontecimentos de 11 de novembro de 1955 e outros movimentos surgidos nos meses de novembro dos anos seguintes, que relembravam a Novembrada fracassada.

A nomeação do general como ministro interino soou para os líderes da Aeronáutica como uma provocação, inclusive porque ocorreu às vésperas do emblemático dia 11 de novembro, desencadeando um movimento de contestação e de repúdio no seio da Força Aérea Brasileira. Muitos oficiais-generais da FAB recusaram-se a comparecer à posse do ministro interino e o brigadeiro Ivo Borges, presente à cerimônia, negou-se a prestar-lhe continência. Um manifesto de apoio ao gesto dos brigadeiros foi redigido ao qual aderiram, inicialmente, algumas dezenas dos mais respeitados oficiais superiores da FAB. Em resposta, o governo determinou a prisão disciplinar dos oficiais signatários, em bases aéreas de Minas Gerais: Pampulha e Lagoa Santa. Nos dias que se seguiram às prisões, centenas de oficiais aderiram ao manifesto chegando perto de mil, deflagrando uma crise institucional que só se resolveu com o retorno antecipado às pressas dos EUA do titular da pasta, o brigadeiro Correia de Mello.

Meu pai, Carlos Henrique Peralta, à época jornalista novato com 21 anos de idade, assinou uma reportagem sobre o assunto, publicada na prestigiosa Revista da Semana  (Edição 48 - 1958).

domingo, 12 de setembro de 2021

Família Villet Peralta: O Patriarca e a Matriarca Fundadores

Hospital Real de Santo Antônio, onde funcionava no século XIX a Escola Médico-Cirúrgica do Porto (Ilustração de 1878)

Foto da fachada principal do Hospital Geral de Santo Antônio, atualmente. 

Esta página do Diário Oficial da União, publicado em 30/10/1898, mostra a relação dos médicos formados em faculdades estrangeiras e com registro profissional no Brasil vigente naquela data. O registro do diploma do trisavô Antonio Botelho Peralta, concedido pela Escola Médico-Cirúrgica do Porto, consta sob número 18, e foi efetuado em 03/12/1880, quando passou a tornar-se obrigatório. O Dr. Peralta teve seu diploma expedido em 14/09/1857 na referida escola, pouco depois de ter se casado.

Antonio Botelho Peralta Maria Adelaide de Burgos Chapuzet Villet, casaram-se em julho de 1856, na cidade do Porto, na igreja de São Martinho de Cedofeita. Após a colação de grau de Antônio, o casal veio para o Brasil, entre o fim do ano de 1857 e o começo de 1858, estabelecendo-se, inicialmente, na antiga Estrada do Comércio, na serra do Tinguá. 

Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro, publicado pelos irmãos Laemmert, na edição de 1859, página 119, informa que Antonio Botelho Peralta exercia a medicina na próspera Freguesia de Santana das Palmeiras, hoje extinta, situada no antigo município de Iguaçu (RJ). A partir de 1866, estabeleceu-se em Paty do Alferes, na antiga Vila de Santo Antônio da Estiva, atual Miguel Pereira (RJ), onde, além de exercer a medicina, foi proprietário da fazenda Pantanal¹ e personagem ilustre da história da cidade. 

O casal Villet Peralta teve nove filhos, entre eles, meu bisavô, Valdomiro Villet Peralta, nascido em 04/07/1877. Seu primeiro filho, Henrique Villet Peralta, faleceu recém-nascido, em fevereiro de 1857, na freguesia de Cedofeita, na cidade do Porto. 

Antonio Botelho Peralta nasceu em Portugal, na localidade de Mirão, na vila de Resende, situada na margem esquerda do rio Douro, no distrito do Viseu, no dia 14/06/1833 e foi batizado em 23/06/1833. Era filho de Josefa Thomasia e Alexandre Botelho Peralta e tinha um único irmão, Luiz Botelho Peralta, que permaneceu em Portugal. Antônio Botelho Peralta faleceu em 27/08/1900, em Paty do Alferes (RJ).

Notícia do falecimento do Dr. Antônio Botelho Peralta em um jornal de Niterói, capital do estado do Rio de Janeiro. A nota contém uma clara incorreção: ele era sogro e não genro do coronel Manoel Francisco Bernardes Junior, deputado estadual fluminense, casado com Ernestina Peralta Bernardes.

Nossa matriarca, a trisavó Maria Adelaide nasceu na cidade do Porto, em 24/01/1837 e foi batizada em 18/02/1837, na igreja de Santo Ildefonso. Era filha de Roza Adelaide de Burgos Villet e de Ludgero José Villet; ela natural de Burgos, na Espanha, e ele, nascido em Lisboa. Faleceu em 12/09/1900, poucos dias depois do marido, também em Paty do Alferes (RJ), há exatos 101 anos no dia de hoje.

Foram eles os fundadores do nosso ramo da família Villet Peralta no Brasil. Deixaram sua terra natal para abrir novos horizontes e graças ao seus esforços e dedicação na edificação de nossa família, podemos ter orgulho de ser seus descendentes. 

¹ No local onde se situava a fazenda existe hoje a escola municipal Pantanal, homenageando a família de Maria Adelaide e Antônio Botelho Peralta. 
Tanto em Miguel Pereira, como também na vizinha cidade de Paty do Alferes, existe uma rua Doutor Peralta, homenageando sua memória.

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

Família Peralta: Um Dia na Piscina - 1950


Este vídeo, originalmente gravado em 16mm, no início da década de 1950, provavelmente, na estância de águas minerais Ouro Fino, próxima de Curitiba, mostra meus avós Dyrce e Arthur Carlos Peralta, divertindo-se num dia de sol, na piscina, com alguns amigos queridos. Um flash back com brincadeiras e alegrias simples, de outros tempos, que nos enchem de saudade. Aparecem no vídeo, José Muggiati Sobrinho e Orlando Loyola (o Changa), suas esposas e alguns filhos. A filmagem foi feita por Aziz Surugi, que por isso mesmo, não aparece no filme. Sua esposa Aracy Viana Surugi, também aparece, bem como uma filha. Estes eram alguns dos melhores amigos de meus avós no longo período em que residiram na capital do Paraná, entre meados da década de 1940 e a década de 1950. Orlando Loyola e Aziz Surugi, por coincidência, eram casados com duas primas de minha avó materna, Olga Soffiatti Biscaia: Aracy Surugi e Yara Loyola. Converti este filme a partir da cópia de uma coletânea de filmes em DVD, que me foi presenteada há alguns anos pelo filho de Aziz, o José Surugi Neto, conhecido por Zeca e hoje já falecido.   

quinta-feira, 1 de julho de 2021

Os Duzentos Anos da Carreira Militar de Ludgero José Villet

Nas inúmeras pesquisas que já realizei na internet, obtive muitas informações sobre a vida militar de meu tetravô, Ludgero José Villet, como oficial do Exército português. Como se sabe, Ludgero era o  pai da trisavó Maria Adelaide de Burgos Chapuzet Villet que junto com o trisavô Antonio Botelho Peralta foram os fundadores do nosso ramo da família Villet Peralta no Brasil.

Pesquisei muito sobre a trajetória de Ludgero no Exército de Portugal em livros e documentos disponíveis, muitos em domínio público, onde encontrei a maior parte dos registros de sua carreira militar. Recentemente, em consultas ao Arquivo Histórico Militar do Exército Português, recebi cópias das fichas individuais do serviço militar do meu tetravô, as quais, exceto pela revelação da opinião pessoal de diferentes comandantes sobre seu desempenho como oficial, pouco acrescentaram aos fatos que eu já conhecia.     

Ludgero sentou praça como Cadete da arma de Infantaria, aos dezesseis anos, exatamente há 200 anos, no dia 1º de julho de 1821, motivo pelo qual resolvi atualizar e republicar este post. Desde logo, foi incorporado às tropas do 1º Batalhão da Legião Constitucional Lusitana que, em seguida, seriam enviadas a Salvador, na Bahia, no baldado esforço de Portugal em conter as primeiras manifestações e conflitos pela Independência do Brasil que, por fim, foi proclamada em 7 de setembro de 1822. 

Os batalhões ficaram sediados no quartel do Carmo, localizado no convento dos carmelitas calçados. Após a consolidação da separação do Brasil de Portugal, Ludgero retornou com as tropas que foram embarcadas de volta em novembro de 1822. A ocupação em Salvador ainda perduraria até o início de julho de 1823, quando o remanescente das tropas portuguesas deixaram definitivamente o país.

Em 12/02/1823, o cadete Ludgero José Villet foi enviado às ilhas de Cabo Verde, então província portuguesa de ultramar na costa da África. Em 21/05/1823 foi promovido ao posto de Alferes, no Regimento de Infantaria nº 20 das Companhias Provisórias de Cabo Verde. Serviu como ajudante de campo do governador do arquipélago, o coronel João da Matta Chapuzet (vide post), que era seu tio (irmão de sua mãe) e o criou como um filho desde a infância, já que ficara órfão de pai antes mesmo do seu batismo. Permaneceu em Cabo Verde até 1825, quando retornou ao continente europeu.

Em 1826, Ludgero foi incorporado ao Regimento de Infantaria número 4. No mesmo ano, seu tio, o coronel Chapuzet, foi eleito deputado às Cortes Gerais representando as ilhas de Cabo Verde. Com o desenrolar dos acontecimentos que dariam início à Guerra Civil que se seguiu à morte de Dom João VI, o Alferes Ludgero José Villet viu-se, desta vez, engajado na campanha militar em defesa do direito de dona Maria da Glória (filha de dom Pedro I do Brasil - Pedro IV de Portugal), ao trono lusitano, tendo firmado auto de juramento de fidelidade (vide post). 

Após a aclamação de dom Miguel pelas Cortes Gerais como legítimo herdeiro do trono português, em 1828, aqueles que haviam jurado fidelidade à causa de dona Maria II passaram a ser perseguidos, presos e sumariamente executados pelo governo miguelista. Ludgero Villet e seu tio João da Matta Chapuzet partiram neste ano para um penoso exílio, primeiro na Inglaterra e depois na Bélgica e França, onde passaram por toda sorte de dificuldades.

Chronica Constitucional do Porto, de 11/04/1833, que publicou o decreto de Dom Pedro, duque de Bragança, promovendo o Alferes Ludgero José Villet ao posto de Tenente (último parágrafo, embaixo à direita). 
A longa expatriação, sucessivamente, nas cidades de Plymouth, Bruges, Ostende e Dunquerque, só terminou quando Ludgero foi admitido nas fileiras do Exército Libertador de Dom Pedro, duque de Bragança, desembarcando com suas tropas na foz do Douro, em dezembro de 1832. Novamente em solo pátrio, Ludgero foi promovido em abril de 1833 ao posto de Tenente, integrando o estado-maior do Tenente-General Thomas Guilherme Stubbs, como seu ajudante de ordens. Segundo os registros médicos que encontrei, Ludgero Villet foi gravemente ferido em combate no dia 1º de dezembro de 1833, num violento confronto com tropas miguelistas na baixa da Areosa, durante o sangrento Cerco da Cidade do Porto. Em 24 de julho de 1834 foi promovido ao posto de Capitão e incorporado ao Regimento de Infantaria número 1.

As informações contidas nas fichas individuais de serviço militar de Ludgero, que recebi do AHM do Exército português, preencheram a lacuna que existia nas minhas pesquisas entre sua última promoção em 1834 e o ano de 1846, quando sua carreira militar se encerrou. Com base nas informações de um livro* que adquiri, descobri que Ludgero foi transferido compulsoriamente para a reserva no posto de Capitão, num ato que evidencia uma perseguição da Junta (Provisória) Governativa do Porto, durante a guerra civil da Patuleia. Por sua vez, as fichas já referidas nada mencionam ou esclarecem sobre os alegados motivos que deram causa à sua aposentação forçada. 

Pelos valorosos serviços militares foi-lhe concedida a comenda e o título de Cavaleiro da Ordem de Aviz, em 22 de novembro de 1842, uma das mais importantes condecorações militares de Portugal. Nas avaliações dos seus comandantes, ao longo dos últimos anos da sua carreira, há sucessivas recomendações para a promoção de Ludgero ao posto superior de Major, o que nunca ocorreu. 

Ludgero vivenciou os tempos tormentosos das revoluções e guerras civis portuguesas da primeira metade do século XIX, sempre fiel ao seu país, servindo sua pátria mesmo nas condições mais adversas da história portuguesa. Apesar dos seus méritos e bons serviços, sua carreira militar havia sofrido atrasos pelo longo exílio e veio a findar precocemente por um ato de evidente vingança política da famigerada Junta da Patuleia

Ludgero José Villet, nasceu em Lisboa, na freguesia de Santa Catarina, em 1805. Em 24/10/1835, na cidade do Porto, casou-se com Roza Adelaide de Burgos Fernandez, natural de Burgos, na Espanha e tiveram pelo menos cinco filhos: Maria Adelaide, Roza, Ludgero, Filipe e Luiz. Roza Adelaide faleceu com apenas 28 anos de idade, em março de 1844. Seus dois últimos filhos morreram em maio de 1844 (segundo o termo de óbito, ambos foram vítimas de coqueluche), logo em seguida ao falecimento da mãe, sendo que um deles tinha pouco mais de um ano de idade e outro alguns meses. 

Sua filha mais velha, minha trisavó Maria Adelaide de Burgos Chapuzet Villet, nasceu na cidade do Porto, em 1837 e ali casou-se com meu trisavô, o médico Antonio Botelho Peralta, em 1856, na igreja de São Martinho de Cedofeita. Nos meses seguintes o casal emigrou para o Brasil e constituíram nossa grande família Peralta, em Paty do Alferes, na serra fluminense, onde nasceram seus filhos brasileiros, que geraram uma enorme descendência, da qual sou parte.

Nada sei sobre a vida de Ludgero, após o falecimento de Roza Adelaide e dos dois filhos mais novos, e nem depois de sua aposentadoria das fileiras do Exército, em 1846. Desconheço, ainda, a data de sua morte que, presumivelmente, ocorreu naquela Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta Cidade do Porto, cidade que amava e pela qual combateu corajosamente. 

* Os Titulares e os Oficiais da Patuleia - Org.:Miguel Esperança Pina, Nuno Borrego e Lourenço Vilhena de Freitas; Editora Tribuna; Lisboa, 2006. 

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Arthur Quirino Simões - 160 Anos - Meu Trisavô e Minhas Raízes Paulistas


Assento do batismo de Arthur Quirino Simões (in Familysearch.org).


Arthur Quirino Simões, meu trisavô, na foto ao alto, sentado à esquerda, e embaixo no detalhe. Ao lado dele estão sua filha e seu genro, meus bisavós: Herundina de Avellar Simões Peralta e Waldomiro Villet Peralta. Em seguida, está minha avó Dyrce Miranda Peralta, tendo no colo Paulo Fernando Peralta, meu tio. A criança atrás dos meus bisavós, é meu pai, Carlos Henrique Peralta. Meu avô Arthur Carlos Peralta é o mais alto, ao fundo. A foto foi tirada no dia 18/09/1939, data em que meus bisavós comemoravam 30 anos de seu casamento.

Nas minhas incursões em pesquisas genealógicas familiares, pelos vários e apaixonantes ramos de famílias das quais descendo, vou pouco a pouco descortinando pedaços do passado e seus personagens, que parecem tão distantes no tempo, mas, estão muito mais próximos do que podemos imaginar.

Este é caso de ARTHUR QUIRINO SIMÕES, meu trisavô, casado com a trisavó LEOCÁDIA CALVET DE AVELLAR, pai da bisavó HERUNDINA DE AVELLAR SIMÕES PERALTA e avô do meu avô ARTHUR CARLOS PERALTA. A proximidade começa pelo meu próprio nome, que herdei de meu avô: ARTHUR CARLOS, o qual não é mera coincidência, porque foi dado pelos meus bisavós ao meu avô em homenagem ao trisavô ARTHUR e ao irmão deste, CARLOS QUIRINO SIMÕES. Conforme consta da certidão, foi o próprio Arthur Quirino Simões que, certamente muito orgulhoso, dirigiu-se ao Registro Civil para declarar o nascimento do primeiro neto, homônimo (ou quase).

Arthur Quirino Simões, nasceu em Campinas, então província de São Paulo, presumivelmente, no dia 4 de setembro de 1861, dado que o assento de batismo, em 04/11/1861, na matriz de Nossa Senhora da Conceição, firmado pelo vigário, o conhecido padre Joaquim José Vieira, diz que o batizando tinha dois meses de idade, naquela data. Seus pais pertenciam a tradicionais e antigas famílias de Campinas e região: os Quirino dos Santos Simões e os Paula Camargo. Era filho do coronel José Quirino dos Santos Simões e de Anna Eufrosina de Paula Camargo, cujas famílias se estabeleceram na região de Campinas em meados do século XVIII ou mesmo, antes disso. 

Seu pai era comerciante, fazendeiro de café e oficial superior da Guarda Nacional*. Entre os muitos irmãos de José Quirino estavam: Francisco Quirino dos Santos, Bento Quirino do Santos e Damiana Quirino dos Santos, que se casou com o futuro senador Francisco Rangel Pestana, todos de grande projeção política e social em Campinas e na Capital paulista, em fins do século XIX e no início do século XX, como escritores, juristas e políticos, abolicionistas e republicanos.  

Arthur Quirino Simões estabeleceu-se no Rio de Janeiro, na ultima década do século XIX, por motivos que ainda desconheço. Foi proprietário, em sociedade com seu irmão Olegário Quirino dos Santos**, de um conhecido comércio de tecidos finos importados, no mesmo local onde antes funcionou idêntico negócio de Cândido Gaffré e Eduardo Palassin Guinle, amigos e sócios de seu futuro sogro, João Gomes Ribeiro de Avellar, o Jaco. Os três fundaram a Gaffré, Guinle & Cia. que seria a precursora da poderosa Companhia Docas de Santos, que se tornaria uma das maiores empresas da América latina. Um post que publiquei neste blog (vide post) conta a história de Jaco, desta sociedade e seus desdobramentos.  

Mais tarde, Arthur trabalhou por algum tempo na firma Gaffré, Guinle & Cia. e, depois, passou a administrar a fazenda do Guaribu, que havia sido herdada pela trisavó Leocádia de Avellar Simões.

Leocádia e Arthur casaram-se no dia 4 de setembro de 1891, na igreja de São João Batista da Lagoa, no Rio de Janeiro, tendo como padrinhos Cândido Gaffré e Eduardo P. Guinle. Nesta ocasião, os pais de Leocádia, Emerenciana Calvet de Avellar e Jaco, haviam falecido alguns meses antes, prematuramente, vítimas da febre tifoide. 

O casal teve dois filhos: Herundina de Avellar Simões (minha saudosa bisavó Neném, como todos nós a chamávamos) e José Quirino de Avellar Simões, conhecido pelo apelido de tio Juca, engenheiro formado na Escola Nacional de Engenharia, que passou a residir em Recife. Foi professor catedrático da cadeira de estradas de ferro e de rodagem, na Escola de Engenharia da Universidade Federal de Pernambuco e diretor do DER daquele estado.

Quando disse no início que os personagens, nossos antepassados, estão mais próximos do que pensamos, é porque o trisavô Arthur Quirino Simões viveu 96 anos, falecendo em 02/11/1956. Conviveu com sua mulher e com todos os seus filhos, netos e bisnetos, por largo tempo. Meu pai contava muitas histórias sobre o mesmo e do convívio, na fazenda do Guaribu, com ele e com a trisavó Leocádia de Avellar Simões, que também faleceu muito idosa. Ele não me conheceu, porque nasci alguns anos após sua morte, mas, conheceu alguns trinetos nascidos antes disso.

Quando as histórias de nossos antepassados são contadas por pessoas que conviveram muito próximos deles, como meus bisavós, avós, meu pai e meus tios, parece que tudo aconteceu ontem e que nós mesmos falamos deles como se os tivéssemos conhecido, pessoalmente. Esta é uma das alegrias e dos encantos das histórias de família, que não deixam que esses personagens morram jamais, nas nossas lembranças.

* José Quirino dos Santos Simões era tenente-coronel da Guarda Nacional e foi promovido a coronel, no ato de sua reforma, publicado no D.O.U de 25/12/1890.  

** A firma denominava-se Quirino Irmãos & Cia. e dela fazia parte, como comanditária, a sociedade Gaffré, Guinle & Cia. A loja situava-se na rua da Quitanda, número 11 e depois número 32. 

quarta-feira, 7 de abril de 2021

O Dr. Antonio Botelho Peralta e As Fake News em 1881

 


Em minhas incansáveis - e sempre surpreendentes - pesquisas familiares encontrei um fato interessante sobre o trisavô Antonio Botelho Peralta e a trisavó Maria Adelaide de Burgos Chapuzet Villet, envolvendo uma fake news da época, a qual motivou um esclarecimento público, estampado nas páginas do jornal Gazeta de Notícias, do Rio de Janeiro, edição do dia 15 de julho de 1881, há 140 anos passados.

A leitura deste corajoso desmentido, redigido num português escorreito e culto, que denota o grau de instrução e de cultura do trisavô Peralta (que era médico cirurgião formado na Escola Médico-Cirúrgica do Porto), revela que na ocasião o casal Peralta era alvo de uma fofoca, uma calúnia assacada por alguns personagens da região de Paty de Alferes, onde o casal residia. 

No primeiro parágrafo, desde logo, justifica os motivos da indignada manifestação: "Venho hoje a público sacudir os últimos salpicos de lama, que, do lodaçal onde se rebalsam, me foram arremessados por uma meia duzia de honrados cavalheiros, cujos nomes ignoro, e que o público, provavelmente conhece melhor do que eu." (grifei)

Ao longo do texto, ficamos sabendo que havia rumores naquela região de que o Dr. Peralta e sua mulher, Maria Adelaide, não seriam casados conforme os ritos da Santa Madre Igreja que, até o advento da República, era a única instituição legalmente incumbida de oficiar os matrimônios válidos. A certa altura, o Dr. Peralta expõe com clareza a questão: "O publico patyense lembra-se de se lhe haver dito por ahi que eu não era casado?..." (grifei) Esta inverídica situação violaria os preceitos religiosos, sendo altamente reprovável pelos costumes vigentes na sociedade do século XIX. 

Mais além, esclarece que estas mentiras haviam sido publicadas no próprio jornal, primeiro "acanhadamente" e, depois, com "desembaraço", mas, sempre anônimas. O libelo prossegue com um estilo marcante e aguerrido de quem nutre uma justa indignação contra as pessoas que, covardemente, semearam esses boatos, os quais provará totalmente falsos e mentirosos, ou seja, uma fake news da época.  

Como prova cabal da verdade, apresenta uma certidão expedida no dia 18/12/1880, por Antonio Maria Correa de Bastos Pina, prior da freguesia de São Martinho de Cedofeita, da diocese da cidade do Porto, que transcreve a íntegra do assento do casamento de Antonio Botelho Peralta e Maria Adelaide de Burgos Chapuzet Villet. A certidão tem os selos e reconhecimentos de firmas exigíveis e foi devidamente chancelada pela autoridade consular brasileira na cidade do Porto, o cônsul Manuel José Rabello. 

Observo que a montagem tipográfica do texto deve ter invertido os últimos dois algarismos do ano do casamento, que constou incorretamente no jornal como sendo 1865, quando o ano correto é 1856. A íntegra da transcrição da certidão foi omitida na foto do jornal, porque ocuparia espaço desproporcional neste post. A publicação da nota e da certidão, coincidiu, talvez propositadamente, com as "Bodas de Prata" do casal Peralta, completadas naquele julho de 1881.

Para melhor assegurar a veracidade do documento cuja transcrição mandou publicar, o Dr. Peralta deixou cópias autenticadas com o vigário da freguesia de Paty do Alferes, o padre Manuel Luiz Coimbra, e com algumas ilustres figuras da comunidade, como o comendador Quintiliano Caetano de Fraga, entre outros, nominados no jornal como testemunhas. 

No derradeiro parágrafo, o Dr. Peralta desabafa ressaltando que quaisquer "torpezas" destas pessoas o encontrariam sempre pronto a reagir e os desafia a que "seus artigos venham appensos a um nome" para deixar de esgrimir "com sombras". Ao final, assina: A. PERALTA.

Suponho que, talvez, essas mentiras hoje conhecidas - ad nauseam - como fake news, tenham ecoado através do tempo e chegado aos nossos dias. Isso poderia explicar o conteúdo absurdo de alguns textos recentes que li na internet, os quais, entre outras tolices, afirmam que o matrimônio do casal Peralta teria ocorrido por meio de procuração, estando ele no Brasil e ela na Europa, desfiando motivos românticos e rocambolescos para emprestar enredo à esta fantasia e, mais ainda, ignorando as origens portuguesas de Maria Adelaide e a Escola de Medicina (vide post) onde o Dr. Peralta diplomou-se, na cidade do Porto, em Portugal.

Apesar de tudo, é maravilhoso para mim, um descendente curioso, conhecer a retidão de caráter e a  firmeza de convicções do meu trisavô, afirmadas num documento notável pelas suas peculiaridades, pela sua veemência e pela excelência do vernáculo em que foi redigido. 

segunda-feira, 22 de março de 2021

O Educador e Construtor de Escolas da FAB



                                                                                

Turma de 1935 da Arma de Aviação do Exército formada na Escola Militar do Realengo 


Aeronave de instrução Fairchild PT-19, da Escola de Aeronáutica do Campo dos Afonsos, pilotada pelo capitão aviador Arthur Carlos Peralta, em 1942.
Revista "A Esquadrilha", ano II, n. 10, 1942.



 


Decretos de exoneração da presidência da Comissão de Estudos e Construção da Nova Escola de Aeronáutica e de nomeação para o comando da EOEIG em fevereiro de 1965 

Correio da Manhã - 28/01/1965


                                                    
No ano em que se comemoram os oitenta anos da Força Aérea Brasileira e da Escola de Aeronáutica, hoje Academia da Força Aérea Brasileira, destaco a importância da participação de meu avô, o brigadeiro Arthur Carlos Peralta, em muitas fases da história desta instituição educacional da FAB, como instrutor de voo, como professor, como comandante do destacamento precursor da futura Academia da Força Aérea e, depois, como presidente da comissão de estudos e construção da mesma. Além da futura AFA em Pirassununga (SP), meu avô comandou a EOEIG em Curitiba (PR), uma grande paixão em sua carreira. 

O brigadeiro Arthur Carlos Peralta, ao longo de sua vida militar, desde que formou-se aspirante na turma de 1935 da arma de aviação do Exército, na Escola Militar do Realengo, sempre foi um educador e um construtor de escolas de oficiais aviadores e de especialistas da aeronáutica. Ao atingir o posto de oficial-general da Força Aérea Brasileira, meu avô contava com mais de três mil horas de voo e possuía todos os títulos de cursos de formação e aperfeiçoamento de oficiais, no Brasil e no exterior, sempre como o primeiro de turma. Ao concluir, em 1957, o Curso Superior de Comando na ECEMAR recebeu a mais alta menção concedida até então pela escola. Todas as suas promoções na carreira militar foram pelo critério de merecimento.

As fotos mostram um pequena parte desta trajetória. Ao alto, pilotando um Fairchild PT-19, quando instrutor de vôo, em 1942. Na seguinte, no mesmo  ano, como capitão-aviador, chefe de classe, à direita na foto, ao lado de dois alunos da Escola de Aeronáutica do Campo dos Afonsos, publicada na revista A Esquadrilha, órgão da escola. Durante grande parte de sua carreira foi instrutor de jovens oficiais aviadores, para o que fez inúmeros cursos de aperfeiçoamento no Brasil e nos EUA. Nas duas fotos seguintes, em julho de 1964, na sua posse como comandante do Destacamento Precursor de Escola de Aeronáutica, em Pirassununga (SP), com a presença do brigadeiro Márcio de Souza e Mello, então comandante da IV Zona Aérea, e de cadetes da escola. Na outra foto, em novembro de 1964, já como presidente da Comissão de Estudos e Construção da Nova Escola de Aeronáutica, sediada naquela cidade paulista, que se tornaria a Academia da Força Aérea Brasileira. Acima, em 1965, como comandante da Escola de Oficiais Especialistas e de Infantaria de Guarda (EOEIG), na base aérea do Bacacheri, em Curitiba, onde serviu por muitas vezes.
Contra capa da revista da Escola de Oficiais Especialistas e de Infantaria de Guarda - EOEIG, de novembro de 1966, com a frase do brigadeiro Peralta sobre a importância daqueles que tornam possível a atividade aeronáutica. 
                                                                                 
Por temperamento e vocação, preferia as funções de comando de tropa àquelas de gabinete ou de estado-maior, especialmente, quando fossem o comando das unidades de formação e aperfeiçoamento de oficiais da FAB. Foi um grande realizador de obras físicas e de melhoramentos educacionais nas Escolas que comandou, deixando um imenso legado formação técnica de qualidade para as gerações seguintes da FAB.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

As Damas de Ouro Reunidas em 20/01/1961


Minhas bisavós, Herundina (Neném) de Avellar Simões Peralta, Rosa (Rosinha) Klüppel Soffiatti e Josefina (Finita) Chalbaud Biscaia, reunidas há exatos 60 anos, no dia do casamento de meus pais, Maria do Rocio Soffiatti Biscaia e Carlos Henrique Peralta, no Clube Curitibano, em Curitiba, em 20/01/1961

Ficaram viúvas relativamente cedo e, ao longo de suas longevas vidas, foram alicerces de suas famílias, em torno das quais reuniam-se frequentemente. Verdadeiras matriarcas dos seus clãs, notáveis mulheres de fibra, amorosas e laboriosas, que criaram e educaram um enorme número de filhos e, mesmo, alguns netos e afilhados. Ao contrário das crendices e preconceitos, quanto ao papel que desempenhavam as mulheres do passado, pessoas como estas eram capazes de edificar famílias numerosas, unidas e bem orientadas, em tempos em que não existiam as facilidades e os confortos modernos.

Não esteve presente neste casamento, embora fosse viva, a bisavó Armanda Gómez Cummings Miranda, mãe de minha avó Dyrce Peralta. Nascida Armanda Gomez Cummings, em 24/08/1889, em Gibraltar, território britânico encravado na Espanha, onde seu pai, Francis Cummings, era oficial do Royal Army. Casou-se com meu bisavô, o capitão-de-fragata Álvaro Miranda (passou à reserva no posto de contra-almirante), oficial da Marinha do Brasil, nascido na Bahia, em 23/09/1882. Este bisavô, casou-se duas vezes, algo incomum no passado, sendo o seu segundo casamento com Isaura Miranda, quem criou minha avó, e assim, de fato, tive cinco bisavós. Destas não possuo nenhuma foto, nem do bisavô Miranda. 

Conheci todas as minhas bisavós, por mais ou menos tempo, e lembro-me vivamente de duas: Neném e Finita. Exceto Rosinha, as demais faleceram quando eu tinha mais de 10 anos de idade.