sábado, 2 de dezembro de 2023

A Família Peralta em Curitiba

Meu pai, Carlos Henrique Peralta, à direita, e os irmãos, na casa da praça do Japão.

Minha avó Dyrce Peralta, na casa da rua Acyr Guimarães, em frente à futura praça do Japão, em fins dos anos 1940. Sobre o muro está meu tio, Cláudio Victor Peralta, nascido em Curitiba.
Meu pai, Carlos Henrique Peralta, em pé, na entrada do Colégio Belmiro César, em Curitiba, em fins da década de 1940. Sentado à esquerda, seu colega José Joaquim, que foi conhecido engenheiro e construtor nesta cidade.  
Arthur Carlos Peralta e sua família tinham por Curitiba e pelo Paraná uma relação de amor à primeira vista. Ele esteve pela primeira vez na capital paranaense em fins de 1937, como primeiro-tenente aviador, para servir no 5º Regimento de Aviação, no bairro do Bacacheri. Nesta época, hospedavam-se numa pensão familiar, onde ficavam os oficiais servindo em Curitiba, localizada bem no centro da cidade e que, segundo minha avó Dyrce, pertencia uma senhora de origem francesa¹. Na ocasião, o destacamento aéreo do Bacacheri ainda não tinha acomodação para seus oficiais. 

Aviador já experimentado, sua principal missão, naquela época, foi pilotar aviões que participariam de programa de levantamento aerofotogramétrico para o Departamento Nacional de Terras e o Ministério da Guerra a fim de determinar e plotar as locações mais adequadas para a construção de aeródromos pioneiros no Paraná e em Santa Catarina, para apoiar a ocupação destes territórios e ampliar a abrangência do Correio Aéreo. O interior desses estados sulinos ainda era coberto por extensas florestas nativas e, na maior parte, inabitado e inóspito. Com isso, foi ele quem determinou onde seriam os aeroportos pioneiros de Jacarezinho, Londrina, Foz do Iguaçu, no Paraná; Lages, em Santa Catarina, entre outros. Neste período, realizava ainda, todas as rotas do Correio Aéreo Militar (CAM), depois Correio Aéreo Nacional, que partiam de Curitiba.


Fotos aéreas da inauguração do campo de aviação de Jacarezinho (PR) - 28/03/1938


Sobrevoando as Cataratas do Iguaçu - início dos anos 1940 - 

No filme de propaganda da CEF, abaixo, cenas de Curitiba em meados da década de 1930, época em que a família Peralta conheceu a capital do Paraná.  

Com seu estilo bem-humorado, expansivo e desinibido, típico dos cariocas, marcou sua presença na gelada capital do Paraná. Numa Curitiba pequena e provinciana, no fim dos anos 1930, meu avô comparecia ao tradicional cafézinho dominical da rua Quinze, em mangas curtas de camisa, bermudas e chinelos, para espanto e admiração dos curitibanos antigos que usavam terno escuro e chapéu, mesmo em pleno verão. Graças ao seu temperamento e liderança, desenvolveu nesta cidade um enorme relacionamento social e amizades próximas e duradouras com pessoas saudosas como Azis Surugi, José Muggiati Sobrinho, Carlos  Orlando Loyola, Eduardo Karam, Jovelino Cerqueira Leite, Carlos Mocellin, entre muitos outros.

Notícia da página de esportes do jornal O Dia de 14/08/1946
Meu avô era um esportista laureado, tendo sido campeão de basquete e atleta multipremiado do Tijuca Tênis Clube, do Rio de Janeiro, em diversas modalidades, do qual recebeu o título benemérito de Atleta Número 1. Este tradicional clube carioca instituiu, em junho de 1956, o Troféu Peralta, em sua homenagem, o qual era concedido aos atletas que mais se destacavam em dedicação, disciplina e eficiência, em cada atividade desportiva. Sendo grande entusiasta do basquete, foi convidado para integrar o time desta modalidade, que existia no Coritiba FootBall Club, que tornou-se o seu clube de futebol preferido na cidade. Jogou, também, pelo Ícaro Atlético Clube, do qual foi presidente de honra.

O casal Peralta e seus amigos em Curitiba: nesta foto, com Idalina e Jovelino Cerqueira Leite. No centro da foto ao alto e, na foto do meio à esquerda, está José Muggiati Sobrinho.    
Sempre que surgia a oportunidade, voltava a servir em Curitiba. Por diversas outras vezes foi comandante da unidade aeronáutica do Bacacheri, a velha base aérea, em suas diferentes etapas, desde o 5º R.Av. à EOEIG, em quase todos os postos, de major a brigadeiro. Pretendia morar em Curitiba, após sua aposentadoria e chegou a construir uma casa, que ele mesmo planejou e desenhou, na rua vereador Garcia Rodrigues Velho, no bairro do Cabral que ainda existe, já desfigurada do seu aspecto original. Um de seus filhos, Cláudio Victor, nasceu em Curitiba, na conhecida Maternidade Victor do Amaral. Outros dois, casaram com filhas da terra curitibana. Minha mãe, Maria do Rocio Biscaia, curitibana, conheceu meu pai, Carlos Henrique Peralta, em Guaratuba (PR), na casa de José Muggiati Sobrinho, amigo comum dos meus avós.

A família Peralta morou em diversos lugares da cidade: na atual rua Acyr Guimarães, na esquina com o que hoje é a praça do Japão; na alameda Augusto Stellfeld; na rua Capitão Souza Franco, esquina com Carlos de Carvalho; e na avenida Munhoz da Rocha. Meu pai e meus tios estudavam no famoso Colégio Belmiro César, que educou gerações curitibanas. Muitos netos e bisnetos do casal Peralta nasceram e vivem em Curitiba, atualmente. Mesmo depois da morte de meu avô, minha avó Dyrce Peralta voltou a residir em Curitiba por algumas vezes. Comprou um apartamento e dividiu-se entre Niterói, no inverno, e Curitiba, no verão. 

Amigos curitibanos reunidos na casa que meu avô construiu, nos primeiros anos da década de 1950, na rua vereador Garcia Rodrigues Velho, no bairro do Cabral, na capital do Paraná. Nesta foto, Azis e Aracy Vianna Surugi. 

 Convite da missa de sétimo dia do falecimento de meu avô, mandada celebrar por alguns de seus muitos amigos curitibanos  
O desejo de terminar seus dias em Curitiba acabou por se concretizar, embora, muito prematuramente. Faleceu nesta cidade, em outubro de 1966, quando comandava a Escola de Oficiais Especialistas e de Infantaria de Guarda (EOEIG) e presidia o Círculo Militar do Paraná, numa festa em sua homenagem, organizada pelos bolicheiros do clube. Preparava-se, na ocasião, em atender ao convite para ocupar o cargo de ministro da Aeronáutica, formulado poucos dias antes pelo general Arthur da Costa e Silva, que acabara de ser oficialmente designado presidente da República, pelo colégio eleitoral da época. Foi promovido, postumamente, ao posto de Marechal-do-Ar e encontra-se sepultado na cripta do Monumento aos Aviadores, dedicado à perpetuar a lembrança dos pioneiros da aviação brasileira, no cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro.

Após a sua morte, o prefeito Ivo Arzua Pereira, denominou uma das ruas do bairro Boa Vista em sua memória, em linha com uma das cabeceiras da pista da base do Bacacheri. Em São Paulo, o prefeito Faria Lima fez o mesmo, com uma rua do bairro Casa Verde; e, em São José dos Pinhais (PR), o prefeito Francisco Ferreira Claudino, homenageou-o com uma importante via central da cidade. O conhecido Palácio de Cristal, ginásio de esportes do Círculo Militar do Paraná, planejado em sua gestão à frente do clube, chama-se ginásio brigadeiro Arthur Carlos Peralta. Em 1967, a Assembleia Legislativa do Paraná concedeu-lhe o título post mortem de cidadão honorário deste estado.          

¹ Minha avó Dyrce Peralta referia-se à esta pensão com a pronúncia Demarré e a uma certa madame Demarré, que seria sua proprietária. Não estou certo sobre a grafia correta deste sobrenome, mas, havia em Curitiba e arredores famílias com sobrenomes Desmarais e Demarest, que se pronunciam de modo parecido em francês. Nunca encontrei maiores informações sobre esta pensão que se situava, segundo minha avó, em fins dos anos 1930, na atual rua Marechal Deodoro esquina com a rua João Negrão, no centro de Curitiba. Sabe-se que, comprovadamente, neste local funcionou uma conhecida pensão chamada Nossa Senhora Aparecida, mas desconheço que eram seus proprietários. Também existiu uma pensão familiar na esquina da rua Conselheiro Laurindo com a rua XV de Novembro, no exato local onde hoje se ergue o conhecido edifício Marumbi.       

Post publicado em junho/2011 e republicado.