quarta-feira, 8 de março de 2023

Família Soffiatti: 135 Anos no Brasil

O piroscafo San Giorgio: a embarcação que trouxe da Itália meus trisavós Soffiatti e sua família

Há exatos 135 anos, no dia 8 de março de 1888 desembarcaram no porto de Santos (SP), vindos do porto de Gênova, na Itália, meus trisavós Pasqua Letizia Trevisani e Attilio Soffiatti para adotar o Brasil como seu lar. Com eles veio meu bisavô Guerino Soffiatti, com oito anos de idade e outros dois irmãos. Deixaram sua terra ancestral em busca de uma vida melhor e mais próspera para eles e para seus descendentes, como tantos outros italianos o fizeram, atraídos pelos programas governamentais de colonização em larga escala na região sul do Brasil, no fim do século XIX. 

O norte da península italiana fora sacudido por um período sucessivo de guerras pela libertação do domínio austríaco e pela unificação da Itália que trouxeram graves consequências socioeconômicas para a região. Meus trisavós são oriundos do antigo comune de Correzzo, que hoje é parte do comune de Gazzo Veronese, no sul da província de Verona. Os pais de minha trisavó Pasqua: Lucia Testini Giuseppe Trevisani, juntamente com alguns filhos, haviam chegado no Brasil alguns anos antes (1877), instalando-se na região de Curitiba, no famoso bairro italiano de Santa Felicidade¹.

À bordo do San Giorgio, chegaram em 1888, também, os tios de meus trisavós, Eutichiano Tognetti e sua mulher; e Ângelo Soffiatti (irmão de meu trisavô) com sua mulher Ermínia Trevisani (irmã de minha trisavó) e um filho. Após um período de mais de dois anos trabalhando em fazendas no interior de São Paulo (em pagamento das suas passagens de navio) Attilio Soffiatti, sua mulher e filhos, desembarcaram no porto de Paranaguá, em 16/11/1890, do vapor Rio Negro³, vindos de Santos. 

A família estabeleceu-se em Itaperuçu, no antigo município de Votuverava (hoje Rio Branco do Sul), na região de Curitiba, no Paraná, onde adquiriram terras. Como o casal Attilio e Pasqua havia sonhado, a família Soffiatti prosperou em negócios na agricultura, no comércio de secos e molhados e madeiras, e multiplicou-se por meio de filhos, netos, bisnetos e trinetos², nascidos no Brasil, dos quais me orgulho de ser um deles. Apesar da adoção do Brasil como lar, meus trisavós e meu bisavô jamais abjuraram sua cidadania italiana e eram orgulhosos de suas origens.

Peça publicitária das décadas finais do século XIX para atrair imigrantes italianos para o Brasil 

Depois de muitas pesquisas, encontrei a imagem do vapor San Giorgio que os trouxe da Itália. O San Giorgio foi construído na Inglaterra, em 1886, nos estaleiros Oswald Mordaunt & Co. de Southampton. Originalmente batizado Shakespeare, foi rebatizado após sua aquisição pela companhia Navigazioni Generali Italiana.

O San Giorgio singrou as rotas do Atlântico por muitos anos, rumo a portos como Rio de Janeiro, Santos, Buenos Aires e Nova York, antes de ser destinado à navegação de cabotagem em águas italianas. Este navio de 2.187 toneladas, 96,85 metros de comprimento e 12,5 metros de largura tinha capacidade para 920 passageiros, sendo 20 na primeira classe e 900 na terceira classe, desenvolvendo 11 nós de velocidade. Transportou milhares de imigrantes italianos para as Américas, que levavam consigo seus sonhos e projetos de uma vida melhor neste Novo Mundo. 

O piroscafo San Giorgio naufragou durante uma tempestade, em 23/11/1920, ao largo de Brancaleone Marina, na costa calabresa, onde seus destroços jazem em águas rasas e são atração para os mergulhadores, ainda hoje.

Crucifixo que pertencia à trisavó Pasqualina Trevisani Soffiatti  (em madeira e bronze com 25,5 X 15 cm), o qual está na nossa família há muitas gerações. (Acervo pessoal de Arthur Carlos Peralta Neto

Há muitos anos, minha avó Olga Soffiatti Biscaia me presenteou com este crucifixo de madeira e metal que, segundo a mesma, está na nossa família há várias gerações e o qual sua avó Pasqualina segurou firmemente entre as mãos, durante toda a travessia neste navio, desde a Itália até o Brasil.


¹ O bairro italiano de Santa Felicidade (vídeo do governo do Paraná acima) tem esse nome em homenagem a dona Felicidade Borges, irmã de Antonio Borges, o proprietário da maioria das terras daquela região de Curitiba. A família tornou-se muito querida pelos imigrantes italianos vendendo lotes de terra a preços justos e tratando com carinho e atenção todos os recém-chegados. Este bairro é internacionalmente famoso pelos seus restaurantes da culinária típica da região do Vêneto e por conservar um belo patrimônio arquitetônico de edificações construídas pelos imigrantes italianos.    
² Bem a propósito deste texto sobre a travessia marítima dos Soffiatti, uma das descendentes de Attilio e Pasqua Soffiatti e trineta de Guerino Soffiatti, Martine Soffiatti Grael, foi campeã olímpica de vela, nos jogos olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016 e bicampeã na mesma categoria em 2020, nas olimpíadas de Tóquio.
³ O vapor Rio Negro, pertencente ao Lloyd Brasileiro foi construído em 1872. Tinha casco de madeira, deslocando 450 toneladas. Fazia rotas de cabotagem entre o Rio de Janeiro e Buenos Aires, na Argentina, com escalas em Santos, Cananeia, Iguape e Paranaguá. Afundou após bater num costão ao largo da ilha Queimada Grande, no litoral paulista, em 17/08/1893.


Atualizado e republicado em homenagem aos cento e trinta e cinco anos da imigração dos meus trisavós, Pasqua Trevisani e Attilio Soffiatti e do meu bisavô, Guerino Soffiatti, os fundadores do nosso ramo italiano no Brasil.